Participo numa rede social de um grupo de identificação de insetos. Recentemente uma moça postou o registo de um casulo aberto e de uma borboleta mirrada. Ela procurou ajudar a borboleta a se libertar. Uma lástima! Quem já observou a eclosão de um casulo, deve ter percebido como é trabalhosa a saída da borboleta. Quando deixamos de admirar esse fenômeno em si e queremos logo ver o inseto com todo o esplendor de suas asas multicoloridas, podemos ser tentados a ajudá-lo. Contudo, a beleza de uma borboleta não pode ser apressada e todo o processo de renascimento é fundamental para isso - se ela não sair aos poucos e se desdobrar lentamente, suas asas nunca abrirão. Isso me lembra de minha infância, quando tentei diversas vezes ajudar as flores em botão a se abrirem, até perceber que isso não era algo que eu poderia forçar.
Quando Deus está criando o mundo em Gênesis 1, após o processo criativo de cada dia Ele o observa e declara: “Isso é bom!”. Quando, enfim criou o homem e, portanto, concluiu toda a Criação, exclamou: “Isso é muito bom!”. Em hebraico, a palavra para bom (tóv) pode significar também belo. No texto grego do Antigo Testamento, o bom de Gênesis 1 é “kalós”, que é bonito. Para o hebreu, algo era bonito quando funcional, quando bem feito; quando capaz de cumprir a sua função; quando bem encaixado num todo maior. Uma borboleta é boa e bonita quando “borboleteia” por aí, flutuando suavemente entre as flores. Mas, note bem, Deus criou coisas boas dentro de uma ordem, cada uma em seu momento, em sua hora apropriada: a borboleta só depois dos lírios. Por isso Gênesis 1 se encaixa no conceito do grego bíblico para “kairós”, o tempo oportuno, conforme Eclesiastes 3: “Tudo tem o seu tempo determinado”. O choro bom e útil é o choro no tempo do luto, não da alegria. A colheita é boa quando, passado o tempo da semeadura, a plantação está madura. Não é bela a dança no dia fúnebre! Mas também não é boa a lamentação no dia da festa.
Amós 5:13, ao descrever o juízo sobre a nação de Israel, afirma que era tempo “kairós” de o homem prudente ficar em silêncio. Esse juízo viria, pois Israel havia pervertido a boa justiça de Deus: o homem justo era oprimido pelo homem mau, que prosperava pisando naquele, além de subornar os juízes para ganhar causas. O conceito clássico de Justiça é simples: a cada um aquilo que lhe é devido. Nesse caso, é devido ao homem vil a reta punição, enquanto cabe ao bom homem ser honrado. Por isso Deus pede, em Amós 5:14, que o justo busque o bem e não o mal. O que é, portanto, uma vida boa? Responder a cada coisa conforme a sua natureza e circunstância. Isto é ser justo!
Caro leitor: a beleza aqui reside em fazer florescer a qualidade própria de tudo o que passa por mim: ajudo a senhora idosa na sua hora de atravessar a rua, dou luz matinal à planta que rego e, na ocasião de atender meu cão, não o trato como filho, pois o cão belo é um cão canino. Eis o segredo da boa sabedoria: dar a cada um o que é devido, no seu próprio tempo – “Kalós” e “kairós”, pois até mesmo o amor, o nosso maior dever (Rm.13.8), necessita dessa compreensão.
(Natanael Pedro Castoldi)