No capítulo 10 do evangelho de Marcos, temos o relato de um episódio desconcertante: “E, pondo-se Jesus a caminho, correu um homem ao seu encontro e, ajoelhando-se, perguntou-lhe: Bom Mestre, que farei para herdar a vida eterna? Respondeu-lhe Jesus: Por que me chamas bom? Ninguém é bom senão um, que é Deus. Sabes os mandamentos: Não matarás, não adulterarás, não furtarás, não dirás falso testemunho, não defraudarás ninguém, honra teu pai e tua mãe. Então ele respondeu: Mestre, tudo isso tenho observado desde a minha juventude. E Jesus, fitando-o, o amou e disse: Só uma coisa te falta: Vai, vende tudo o que tens, dá aos pobres e terás um tesouro no céu; então vem e segue-me. Ele, porém contrariado com esta palavra, retirou-se triste, porque era dono de muitas propriedades”. (Marcos 10.17-22)
O primeiro impacto que temos ao ler esse texto é que Jesus, sempre tão misericordioso, tão compassivo, tão compreensivo, foi longe demais em suas exigências. Dá realmente vontade de Dizer: “Coitado do cara! Tão bem intencionado e leva tamanho balde de água fria?”. Ora, se desde criança ele se mostrava um irrepreensível cumpridor dos mandamentos da lei de Deus; se era um homem humilde, educado ao ponto de mesmo não conhecendo direito Jesus, ajoelhar-se aos seus pés e chamá-lo de “bom mestre”, por que Jesus foi tão exigente e tão seco com ele?
Bem, num primeiro momento, parece não haver resposta a essa pergunta, entretanto, as linhas e as entrelinhas deixam bem claro, que apesar de tanta “boa intenção”, esse homem ainda estava redondamente enganado tanto em relação à natureza divina, quanto em relação à natureza humana. Portanto, seria desnecessário dizer que tal engano impedia que ele também pudesse se ver a si mesmo como realmente era.
Percebendo Jesus tais equívocos, decide aplicar-lhe um teste impressionantemente eficaz. Num primeiro momento Jesus desmistifica essa ilusão acerca da bondade humana. Claro, Jesus podia aqui ter se revelado como o Filho de Deus. Em outras circunstâncias Ele o fez sem rodeios, mas preferiu aplicar o teste segundo a visão que esse homem tinha d’Ele: “Um bom mestre”. Depois, Jesus o testa pela obediência aos mandamentos. É evidente que aqui ou ali, alguma coisa devia ter escapado. Se ninguém era perfeito, muito menos esse homem o seria. Entretanto era assim que ele via a si mesmo em relação aos mandamentos: cem por cento fiel, desde a infância. Incrível que alguém pudesse ter esse conceito de si mesmo! Então, percebendo a dimensão que a justiça própria havia alcançado no coração desse homem, Jesus aplica-lhe o golpe fatal: “Vai, vende tudo o que tens, dá aos pobres e terás um tesouro no céu; então vem e segue-me”. Nesse ponto desabou a sua postura e a sua compostura: “Ele, porém contrariado com esta palavra, retirou-se triste, porque era dono de muitas propriedades”.
Para mim fica claro que no coração desse homem, maior do que o anseio pela vida eterna era a necessidade de sentir que a merecia. Merecê-la seria um grande feito e ele poderia finalmente provar a si mesmo que era um homem bom. Deve ter sido um choque e tanto dar-se conta que se esforçava desde criança para conquistar o céu e no entanto acabava de demonstrar publicamente que continuava aprisionado às coisas deste mundo. Triste, não?
Prezado leitor: Será que Deus sempre nos pede tanto? Depende! Depende do quanto desejamos realmente a vida eterna, depende do quanto ainda achamos que a merecemos, depende do tamanho dos nossos apegos terrenos. Para quem está disposto a entregar tudo, talvez Deus nem peça nada, por que afinal, sendo a salvação um ato da graça de Deus, tudo o que Ele deseja é o nosso coração. Mas ali pode estar a grande dificuldade: “Porque, onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração” – Mateus 6.21.
JESUS, A OPÇÃO DA VIDA!