Por: Pr. Armando Castoldi
Eu me criei num mundo quieto. Como vivi meus primeiros dezesseis anos no interior e sem luz elétrica, me habituei com o silêncio e com o correr vagaroso do tempo, no seu tempo real. Vinha à cidade, sim, especialmente para estudar, mas retornava diariamente para casa. Então, boa parte do meu tempo dedicava às lidas da agricultura. Ao lembrar daqueles tempos, fico impressionado como o tempo demorava para passar.
Quero citar como exemplo, todo o ritual que envolvia o processo da cultura do milho: lavrar a terra na primavera, fazer os sulcos, plantar a semente, realizar a primeira capina e puxar mais terra para junto das raízes. Depois a segunda capina, a retirada do pendão - usado como alimento para os animais. Adiante, já no outono, quando a espiga estava madura, pé por pé, dobrávamos os caules, para que a espiga ficasse voltada para baixo, protegendo-a assim da umidade.
Só depois, junto com a pastagem de inverno, vinha o tempo da colheita. Espiga por espiga, com lançamentos precisos, íamos formando aqueles belos montes em linha, que recolhíamos com a carroça e depois em casa, balaio por balaio, depositávamos no paiol. Ali, finalmente as espigas ficavam à disposição para seus variados destinos. Nos dias de chuva, quando não podíamos fazer outra atividade, que festa: O dia de descascar milho! A família toda reunida no paiol, sentados sobre aquele monte de espigas, cada um munido de sua tabuinha com um prego na extremidade, usado para fazer o primeiro rasgo na palha. Então, abrindo-a em duas partes, ia se desenhando diante dos nossos olhos aquele desfile impressionante de sorrisos de dentes dourados. A maioria delas era destinada para o consumo dos animais. Daquelas que tinham os melhores grãos, parte era armazenada para servir como semente e outras, para serem moídos e transformados na inigualável iguaria, orgulho da nossa culinária italiana: a polenta.
E para mim então sobrava a consumação do processo, numa das experiências mais marcantes que carrego da infância: o dia de ir ao moinho. Uma viagem a cavalo, do Lajeadinho até o moinho do Bratti – moinho de água e de pedra, na Linha Lambari, atravessando os morros da Santa Clara. Chegava lá pelas dez horas da manhã, deixava os grãos para serem moídos, almoçava nos meus avós maternos, que àquela altura moravam ali próximos, em companhia dos meus tios. Então, pelas três horas da tarde, recolhida a farinha e retornava para casa: o bater dos cascos do cavalo, num passo preguiçoso; o ringir ritmado dos arreios, o canto dos pássaros; vez que outra o grito de algum agricultor na sua lida. Sons e vozes que para mim compunham o próprio silêncio, que eu sorvia com um prazer indescritível.
Mas depois que inventaram a máquina de debulhar milho, como se costuma dizer por aqui, o mundo nunca mais foi o mesmo. E não é um fato? Vivemos hoje num sistema avesso à intimidade. Há trabalho demais, distrações demais, informações demais, propaganda demais, barulhos demais, tentações demais. Então, contraditoriamente, a intensidade do ritmo nos roubou a intensidade dos relacionamentos. Entupidos de quinquilharias e assaltados por mil apreensões, estamos nos tornando sós, confusos, amedrontados, enlouquecendo coletivamente.
Prezado leitor: Não sei como está sua vida, mas quero compartilhar algumas perguntas que de tempos em tempos preciso fazer a mim mesmo: Ainda consigo passar longos tempos sozinho, sem ficar ansioso? Ainda consigo conversar com alguém, sem ter ao mesmo tempo mil pensamentos passando pela mente? Ainda consigo passar longos tempos na presença de Deus em oração, leitura da Bíblia e meditação? Quando as respostas não são satisfatórias, sei que é hora de começar a apagar as falsas luzes que estão ofuscando minha visão e retornar à intimidade: “Aquietai-vos e sabei que eu sou Deus” ... “Buscai-me e vivei”. (Salmo 46.10, Amós 5.6)
JESUS, A OPÇÃO DA VIDA!